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26 de julho de 2009

METADE DA(O) CARA

Ser flamenguista até a morte e se apaixonar por um vascaíno doente te faz vestir uma camisa da cores que você mais odeia apenas porque o amor dele pelo time poderá um dia ser menor do que o dele por você.

E não se admire se a paixão por um representante da indústria farmacêutica criar em você um amor incondicional por bulas de remédios ao invés dos livros que costumava ler. Uma hora essa sua fase hipocondríaca amorosa passa.

Amar os pés-de-pato do seu namorado mergulhador abre seus horizontes sobre um mundo de amor sub-aquático que jamais imaginaria. Ainda que não seja fácil encontrar padres loucos para casamentos embaixo d´água.

Se for um cantor, sua maior diversão no fim de semana é o videokê, ao lado da penca de produtores musicais que serão seus melhores amigos.

Engorda se se apaixonar por um gourmet. Mas pelo menos aprende a cozinhar, de uma vez por todas, mesmo que isso te custe os mais pesados quilos de sua vida.
Nada que uma nova paixão não possa fazer emagrecer, caso ele seja um esportista. E acordar seis da manhã com olhos vibrantes será parte das provas de amor diárias que você dará, entre um cooper e outro.

Dormirá com calculadoras amando um matemático. E as contas dos restaurantes serão feitas tal qual antigamente, com regras de três e noves fora, sem auxilio de artifícios eletrônicos quaisquer. Você seria capaz até de calcular com um ábaco.

Seguiria todas as tendências da moda se seu amor for um membro fervoroso do mundo fashionista. E mesmo que todos pensem o contrário, você o exibirá como o mais másculo de todos entre os homens.

Até que um dia você se apaixona por um fanático de esquerda. E o que os une são as passeatas e reuniões secretas do partido e mais aquilo que parece ilegal, mas nada amoral.

O amor por um barman te levará a amar bandejas e tudo o que se equilibra sobre elas. E suas noites só começarão quando as dele terminarem.

Buscar a cara-metade faz de você a metade da cara do cara. E sem se dar conta, essa metade pode ser muito diferente de tudo aquilo que pensou ser um dia.

Em cada amor, sempre haverá uma nova promessa de personalidade, impulsionada pela vontade de estar mais perto.
E isso faz de nós hoje um pouco de cada um dos amores que já tivemos. Meio loucos, profanos, caretas, tiranos.

Mesmo que não dê certo, o melhor é saber que o depois sempre nos deixa maiores do que o que um dia fomos.




TEXTO: Micheline Mustafa

5 de julho de 2009

ÚLTIMO ORGASMO



Você lembra quando foi a última vez em que teve prazer de verdade?

Quando foi, mesmo no frio polar, que você se queimou em brasa só por pensar?

E quando um som deixou você excitada a ponto de gritar?

Quando uma notícia te deixou com cara de abobada, e de tão feliz extasiada?

Lembra quando foi a ultima vez em que o cheiro de alguma coisa irresistível te fez desejar comer, e se lambuzar, sem ao menos se preocupar por estar sendo observada?

Quando um toque te fez ensurdecer mesmo diante de buzinas frenéticas?

Um beijo roubado, no momento menos esperado, te fez transpirar?

Quando teu corpo te deu tanto prazer só de caber na calça apertada?

E a chegada de alguém fez com que seu dia virasse uma festa na madrugada?

Quando foi a ultima vez que sentiu prazer por ouvir as palavras ininteligíveis do seu bebê?

Quando gozou de verdade os minutos ao lado do seu velho avô?

Quando foi a ultima vez que se sentiu vivo simplesmente por ter dito “eu te amo”?

Quando sentiu um raio eletrificar o seu corpo ao ser abraçada?

Quando sentiu prazer por vestir uma roupa velhinha, cheia de lembranças, costurada?

Quando foi feliz orgasmicamente, a ponto de enlouquecer?




Quando sentiu gozo só de saber que tantos amam você?

Quando a liberdade te deu tanto prazer a ponto de cometer mancadas?

Quando uma palavra foi suficiente para te fazer subir pelas paredes, enebriada?

Quando foi a ultima vez que sentiu prazer em não precisar obedecer, responder, esclarecer?

Quando um assobio fez você rejuvenescer?

Quando foi que suas pernas bambearem só por ver braços se abrindo pra você?

Quando alguém fez você sentir a plenitude somente por não ter ido?

Quando sentiu prazer por ser você, sem pensar em quem deve agradar para ser aceita?

Quando se sentiu inteiramente vivo por ter visto um nascimento?

Quando o trabalho te fez desejar fazê-lo, mesmo que fosse num domingo?

Quando de verdade se extasiou só por ver uma fotografia publicada?

Quando sentiu prazer por simplesmente ser elogiada?

Quando sentiu pela ultima vez o prazer da gargalhada?

Quando uma mágoa curada, uma briga esquecida e uma desculpa aceita te fizeram sentir relaxada?

Quando foi a ultima vez que gozou só por ouvir a sua música na estrada?

Quando uma lembrança do passado te fez querer rebobinar a fita e deixar a imagem congelada?

Quando se permitiu ao invés de proporcionar?

Quando se sentiu inteira sabendo que era a metade de alguém?

Quando uma voz te fez emudecer?

Quando, de verdade, teve orgasmos somente por viver?

Você pode nem saber responder...
Mas a vida ainda lhe dará múltiplus, infindáveis momentos de prazer.
Tantos e todos deliciosos.
Quando você terá cara de gozo, ar sereno, os cinco sentidos inoperantes, estáticos, catatônicos.

É só deixar acontecer.
E quando estiver na hora, você vai saber.

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